quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

PSOL quer substituir deputados financiados pela corrupção na CPI da Petrobrás

De 15 deputados, pelo menos dez receberam recursos das acusadas. 'A sociedade não pode aceitar que os investigadores tenham recebido dinheiro da corrupção'

Najla Passos

Nesta quinta (25), durante a primeira reunião da nova CPI da Petrobrás, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) apresentará um requerimento preliminar para impedir que os deputados que receberam doações de campanha das empresas investigadas pela Operação Lava Jato possam integrar o grupo. 

De acordo com Valente, um levantamento preliminar aponta que, dos 15 membros já indicados para integrar à comissão, pelo menos dez receberam doações das empresas que, agora, devem investigar. A lista inclui o presidente da CPI, deputado Hugo Motta (PMDB-PB), e o relator, Luiz Sérgio (PT/RJ).

Dados disponíveis no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontam que, do total dos R$ 742 mil arrecadados para a campanha de Motta, R$ 451 mil foram doados pelas empreiteiras Andrade Gutierrez e Odebrecht, ambas investigadas por participação no esquema de propinas alvo da Lava Jato.

Já Luiz Sérgio recebeu R$ 962,5 mil em doações das empresas Queiroz Galvão, OAS, Toyo Setal e UTC, o que representa 39,6% da receita da sua campanha. Pelo requerimento do PSOL, também ficam excluídos da CPI os deputados que receberam doações indiretas dessas empresas, ou seja, por meio de repasses aos comitês partidários.

“A sociedade não pode aceitar que os investigadores tenham recebido, ou sejam suspeitos de terem recebido, dinheiro da corrupção”, afirma Valente. Segundo ele, esta CPI precisa ‘investigar de verdade, sem interferências externas”. E, para isso, é preciso ser isenta e imparcial em relação aos envolvidos. “A CPI não pode ficar sob pressão do poder econômico”, reforça.

O deputado acrescenta que, sem uma investigação rigorosa, é impossível saber se o dinheiro usado para as doações de campanha é limpo ou se é produto das propinas distribuídas pelo esquema. “A CPI precisa investigar, inclusive, a relação do financiamento de campanha com a corrupção envolvendo a Petrobrás”, defende.

O requerimento tem como base o artigo 180 do Regimento da Casa, que prevê que os parlamentares não podem votar em causa própria, nem em assuntos de seu interesse. A decisão é exclusiva do presidente da CPI, que pode ouvir o plenário só se julgar recomendável.

Créditos da foto: Marcos Oliveira/Agência Senado


Texto original: CARTA MAIOR

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

PRIMAVERA ÁRABE À BRASILEIRA!

Por Antônio Carlos


Sempre aparecem aquelas músicas que se torna a onda do momento e a grande maioria passa a escutar nem sempre pela qualidade da música! Mas ultimamente em todos os assuntos tem a onda do momento e na política não poderia ser diferente.

Quando garoto, a toada era se criticar o Regime Militar e todos aqueles que sofreram algum tipo de revezes apareceram como as almas puras que mereciam serem eleitos para algum cargo. Com o tempo se percebeu, que ficar contra o regime militar ou mesmo os que foram perseguidos por eles, nem sempre estavam preocupados com os problemas sociais. Alguns defendiam interesses próprios e apenas sofreram perseguição dos concorrentes (caso de muitos empresários).

Quando fiquei adulto, a toada era que deveríamos eleger representantes dos trabalhadores. Por incrível que pareça, nem sempre os chamados representantes dos trabalhadores defendem interesses dos trabalhadores e nessa toada (onda) a coisa ficou ainda mais difícil identificar quem realmente estava defendendo interesses de toda sociedade, já que se misturaram a ideia de se eleger representantes dos trabalhadores, os que se diziam perseguidos ou não do Regime Militar e os que só estavam defendendo interesses próprios.

Mas a música do momento e caçar e acabar com a corrupção como se no passado não existissem corruptos e corruptores (clique para ler O Golpismo e a última pesquisa do Datafolha). Na grande imprensa os músicos (jornalistas) manipulam as informações como se as construtoras e demais empresas (estatais e privadas) passaram a ser corruptas somente a partir de 2005 (clique para ler Petrobrás: governo que moraliza leva a fama de bandido)! O problema é que todos seguem os músicos, igualmente a história do tocador de flauta que conseguiu hipnotizar, está manipulando a todos e sem perceberem que a música está levando a todos ao abismo. Somente este procedimento está levando algumas empresas à falência com fechamento e desemprego em massa. Em países, os considerados mais desenvolvidos, em que existe uma preocupação social em defender os empregos, os corruptos e corruptores seriam presos e em seus lugares seriam colocados sócios substitutos ou interventores para que as empresas fossem mantidas e para manter a sociedade funcionando sem prejuízos dos trabalhadores, do Estado e demais sócios destas empresas. A quem interessa que essas empresas continuem fechando e desempregando tantos trabalhadores? Para quem ou para quais empresas esses músicos estão tocando essa música? (clique para ler Construtoras da Lava a Jato enfrentam enxurradas de ações).

Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso foram fechados os estaleiros, gerando milhares de desempregados e somente durante o governo Luiz Inácio esses estaleiros voltaram a funcionar gerando milhares de empregos. Devido a Operação lava-jato está investigando e dificultando operações da Petrobras com as construtoras de navios e de rebocadores já está promovendo e fechando empresas de construções de navios, cortando pagamentos de construtoras e fazendo diminuir o valor das ações da Petrobras.

Mas eu pensava que todos os seguidores entravam no ritmo da música inconsciente para punir corruptores e corrompidos! (Clique para ler Um advogado a favor da destruição das empresas de construção). Estranhamente muitos jornalistas e políticos estão pedindo o fechamento das maiores construtoras do país (geram milhares ou mesmo milhões de empregos) e substituam por empresas estrangeiras como se nas empresas estrangeiras não existe corrupção! O mais estranho é que os chamados militantes do PSDB acham que deveríamos contratar construtoras americanas e os chamados militantes de esquerda contam em verso e prosa que deveríamos contratar construtoras Russas e Chinesas (vi muita gente defendendo essa opção). Além dos problemas sociais que podem causar no Brasil, será que os caçadores de corruptos sabem que as construtoras estrangeiras também são consideradas altamente corruptas? Será que estão escondendo esses fatos com interesses escusos?

A cegueira é tão grande que esses músicos conseguem criar uma onda onde os brasileiros pedem que sejam fechadas nossas empresas, nossos trabalhadores demitidos e toda tecnologia existente nessas empresas sejam entregues aos concorrentes! (clique e leiam PRG viaja aos EUA para acusar o próprio país?) Será que não perceberam que podem estarem utilizando o momento para fecharem nossas construtoras e a Petrobras que são concorrentes fortíssimas (são detentoras de alta tecnologia nos seus respectivos ramos) dessas empresas internacionais e que podem está sendo manipulados para que entreguemos nossas empresas de mão beijadas!!!

Que se puna os corruptores e corrompidos (clique para ler Petroleiros: Punir corruptos, mas sem destruir a Petrobras), sem causar problemas e prejudicando milhares de brasileiros que trabalham arduamente nessas empresas. Temos de lembrar que esses donos de empresa e políticos corrutos se apossam dessas riquezas, mas os trabalhadores nunca são beneficiados, pelo contrário, também são alvos da ganância de empresários que ganham retirando do Estado e também ganham retirando direitos desses mesmos trabalhadores.

As manifestações, chamadas PRIVAMERA ÁRABE, ocorreram em vários países dos diversos continentes. Pode-se dizer que as manifestações, de junho de 2013, foram um reflexo desta PIRMAVERA ÁRABE e que os participantes diziam que eram contra tudo que está aí! Mas na prática, as manifestações PRIMAVERA ÁRABE, serviram para os EUA influenciarem e derrubarem governos e colocarem políticos que lhes eram favoráveis (um grande exemplo ocorreu no Egito). A nossa PRIMAVERA ÁRABE será um pouco diferente? A quem interessa? 

Texto original: CARLOS GEOGRAFIA
Não deixem de ler:
- Esqueçam o impeachment de Dilma e conheçam a trama imunda do "climão"
- A Globo não ataca o Governo, ataca o Estado nacional
- O entreguismo e os que querem o fim do Brasil. Não devemos combater o Brasil e o povo brasileiro

domingo, 22 de fevereiro de 2015

A imprensa debate a reserva de mercado do petróleo, mas não a dela própria

Postado em 17 fev 2015     por : Paulo Nogueira

Dou uma zanzada pelo Twitter de manhã e alguém posta o link de um artigo do Estadão que critica a reserva de mercado nos projetos de pesquisa e exploração em petróleo. “A reserva criou amigos do rei”, segundo o Estadão.

Retifico: não foi alguém que postou. Foi Tuca Pinheiro, assessor de Roberto Freire e marido de uma repórter do Estadão que produz grandes quantidades de reportagens contra o governo.

Tuca, todos os dias, despeja no Twitter links antipetistas. Quase todo material novo da Veja é retuitado por ele.

Pensei o seguinte, ao ler aquele tuíte específico. Não. Fiz mais que pensar. Escrevi.

“E a reserva de mercado na mídia, criou o quê?”

Pouca gente sabe que as empresas de jornalismo ainda hoje, tantos anos depois que a globalização abriu mercados mundo afora, são protegidas por uma reserva de mercado.

É uma contradição espetacular para empresários que gostam de pregar as virtudes do capitalismo.

Eles gostam da competição que o capitalismo traz. Mas não para eles.

A reserva de mercado que ainda vigora no Brasil é um dos maiores símbolos de como a mídia conseguiu manter velhos privilégios graças a seu poder de intimidação, influência e retaliação.

É virtualmente impossível encontrar, nos jornais e revistas brasileiros, algum texto sobre o assunto, pelo caráter vexatório dele.

Procure na Folha, por exemplo, algum editorial que defenda a reserva para ela.

O Globo uma vez deu um artigo que defendia o que é indefensável.

Dois pontos eram sublinhados para justificar a reserva. Um: ela elimina o risco de propaganda maoísta.

Imagino que a referência fosse à possibilidade de algum grupo chinês desejar se estabelecer no Brasil não para fazer dinheiro, como o australiano Murdoch ao se expandir para a Inglaterra e para os Estados Unidos – mas para promover, insidiosamente, o comunismo ateu.

O segundo argumento é que, vedando o acesso a estrangeiros, estaria preservado o patrimônio cultural brasileiro representado pelas telenovelas.

Este artigo foi escrito pelo advogado Luís Roberto Barroso, hoje no STF, quando trabalhava para a Abert, associação de lobby da Globo.

Na prática, a reserva facilitou extraordinariamente a vida das empresas jornalísticas nacionais.

Somada a outros privilégios como a bilionária verba publicitária oficial e o acesso generoso a financiamentos de bancos públicos como o BNDES, a reserva explica em boa parte o país pobre e os empresários da mídia riquíssimos.

Governos como o de Sarney e o de FHC foram coniventes com a pilhagem do dinheiro público pelos barões da imprensa.

Mais recentemente, nem Lula e nem Dilma tiveram coragem de enfrentar os privilégios.

Como sempre acontece quando vantagens são concedidas a certos grupos poderosos, e depois mantidas perenemente, é a sociedade que perde.

Graças à internet este debate é agora, ao menos, possível.

Antes, nem isso – pelo bloqueio imposto por jornais e revistas.

Não é muito, mas já é um avanço.

Texto original: DCM

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Especial: As mandíbulas que mastigam a Nação

Bancos pagam menos impostos que os assalariados. Alguns brasileiros detêm US$520bi em paraísos fiscais. A estrutura tributária devora o futuro da nação.

Joaquim Palhares - Diretor da Carta Maior

Em tese, a política fiscal seria o espaço da solidariedade no capitalismo.

Caberia a ela transferir recursos dos mais ricos para os fundos públicos, destinados a contemplar os mais pobres e o bem comum.

Sem carga tributária adequada não se constrói uma Nação, mas um ajuntamento desprovido de laços e valores compartilhados em direitos e deveres comuns.

A carga tributária adequada depende do estágio de desenvolvimento da sociedade. Mas não só isso. Sua composição é decisiva na incidência regressiva ou redistributiva que provoca.

Um país como o Brasil, com 200 milhões de habitantes e enormes carências estruturais, não pode avançar com uma carga inferior a de uma Europa, por exemplo, cuja infraestrutura está consolidada (nos dois casos, a carga média gira em torno de 36%; mas há vários países com infraestrutura madura onde a carga passa de 40%).

O sistema brasileiro avulta, ademais, como um caso pedagógico de regressividade.

Impostos indiretos, embutidos nos preços dos bens de consumo, representam mais de 60% do que se recolhe.

Não importa a renda do consumidor: ganhe um ou 100 salários mínimos por mês, o imposto que paga por litro de leite é o mesmo.

Regressividade é isso: uma engrenagem fiscal feita para taxar igual os desiguais. Pagam mais os pobres do que os ricos.

O imposto sobre o patrimônio, em contrapartida, que incide diretamente sobre os endinheirados, não chega a 3,5% da arrecadação total no Brasil.

Nem é preciso ir à Suécia para um contraponto.
Na festejada Coréia do Sul, meca da eficiência capitalista, ele é da ordem de 11%; nos EUA passa de 12%.

A taxação direta no Brasil recai muito fortemente sobre os assalariados da classe média (amplo sentido). Isso explica, em parte, a revolta com a baixa qualidade dos serviços públicos obtidos em troca da elevada contribuição.

Cerca de 25% da receita fiscal incide diretamente sobre a renda, assim:

a) a metade sobre o holerite da classe média;

b) a outra metade sobre os ganhos de capitais, que é onde se concentra cada vez mais a riqueza no capitalismo financeiro dos nossos dias.

Bancos, por exemplo, pagam menos impostos no Brasil que o conjunto dos assalariados. Um exemplo sugestivo e muito recente: Bradesco e Itau, foram flagrados em operações em paraísos fiscais, que lhes propiciaram, apenas em 2009, abater US$ 200 milhões em tributos.

As distorções não param aí.

Artimanhas contábeis, por exemplo, permitem que um banco lance o pagamento de dividendos como gasto com juros, abatendo o montante do imposto. Assim por diante.

A receita obtida tampouco se destina automaticamente a reduzir abismos sociais.

Há filtros de classe pelo caminho

A dívida pública é o principal deles.

Ela funciona como uma espécie de reforço na regressividade do sistema fiscal brasileiro.

Assemelha-se a um enforcador que subordina o princípio da solidariedade à primazia rentista.

O mecanismo ‘autossustentável’ ganhou seu upgrade com a ascensão da agenda neoliberal que privilegiou o Estado mínimo em todo o mundo.

A ideia era deixar à proficiência do mercado a tarefa de alocar a riqueza, ao menor custo e com a máxima eficiência.

Em vez de arrecadar, isentar os ricos passou a ser a lógica.

Sem espaço político para taxar endinheirados e o seu patrimônio, governos então passaram a ser cada vez mais compelidos a compensar a anemia tributária com endividamento público.

Emprestam e pagam juros por aquilo que deveriam arrecadar taxando os ricos, as heranças, as operações financeiras, o capital especulativo, o ganho da república dos acionistas (isento).

Do ponto de vista do dinheiro grosso, apesar de toda a lengalenga do ‘impostômetro’ o Brasil é um belo exemplar dessa lógica.

Simples assim: a dívida cresce, engessa o futuro do desenvolvimento, eleva a dependência em relação ao mercado financeiro e abre novos piquetes de engorda do capital rentista.

Piketty resumiu: se o capital financeiro rende mais que o crescimento da economia – como tem sido sistematicamente o caso do Brasil -- consolida-se uma casta de riqueza inoxidável que se descola da sociedade e perpetua a cicatriz da desigualdade.

O segredo do negócio é a vigilância diuturna da matilha midiática sobre a boa gestão da engrenagem, leia-se da dívida pública.

O dinheiro grosso investe nisso. Uma legião de consultores dá plantão permanente no telefone para esclarecer e municiar seus ventríloquos e ventríloquas lotados em obsequiosas colunas diárias.

Os economistas de banco estão sempre disponíveis. Faz parte de seu trabalho municiar a guerra rentista.

Prover a ração bilionária destinada anualmente aos juros é o objetivo. No linguajar técnico, trata-se de fazer cumprir a ‘meta cheia do superávit primário’.

Reconquistar a ‘confiança’ rentista na política fiscal, teoricamente ensombrecida por artifícios contábeis cometidos em 2013 no país – tolos, mas lícitos — é o cerne do ajuste pilotado nesse momento pelo centurião das boas causas do ramo, Joaquim Levy, sugestivamente conhecido como ‘Joaquim Mãos de Tesoura’.

Mídia, consultores, professores banqueiros e assemelhados adiantam que o que se assiste é só o começo.

O Brasil precisa de arrocho efetivo, dizem eles; corte real nas despesas, sem aumento de impostos, para recuperar a credibilidade.

E mais juros.

A agenda fiscal brasileira foi sequestrada pelo rentismo há muito tempo.

Discute-se de tudo -- carga excessiva, gestão deficiente dos gastos, superávit insuficiente, maquiagens, etc.

Menos o custo do próprio rentismo para o país.

Em média, o preço da supremacia financeira sobre a agenda fiscal custa R$ 200 bilhões por ano.

Cerca de 5% do PIB em juros pagos aos detentores de títulos da dívida pública.

Equivale a quase dez vezes o custo do Bolsa Família.

É quatro vezes mais o que supostamente custaria a implantação da tarifa zero no transporte coletivo das grandes cidades brasileiras.

Treze vezes o que o programa ‘Mais Médicos’ prevê investir em obras em 16 mil Unidades Básicas de Saúde; na aquisição de equipamentos para 5 mil unidades já existentes; com as reformas em 818 hospitais; para equipar 2,5 mil outros e providenciar melhorias nas instalações de 877 Unidades de Pronto Atendimento.

Repita-se: o dinheiro destinado ao rentismo em um ano daria para multiplicar por 13 a escala e a intensidade do programa ‘Mais Médicos’, atacando mais depressa carências sabidas na infraestrutura da saúde pública.

Não serve de consolo, mas já foi pior. No final do governo FHC, gastava-se quase 10% do PIB com juros.

No momento em que o país está sendo coagido a adotar o arrocho para resgatar sua credibilidade macroeconômica, nunca é demais recordar que a injustiça fiscal é só a primeira película da riqueza rentista.

A sonegação é outra camada espessa dessa cebola ardida.

Sendo a oitava economia do mundo, o Brasil tem a quarta maior fortuna abrigada nos paraísos fiscais do planeta: US$ 520 bilhões . Como esse dinheiro chegou lá? Não chegaria sem a inestimável colaboração de bancos e instituições do mercado cujos chefes de departamento de 'análise econômica' inundam os jornais com alertas sobre o 'desequilíbrio fiscal' e oferecem o antídoto: 'as reformas', cujo cerne é o escalpo de direitos, de serviços públicos e de folhas de servidores 

No escândalo mais atual dessa cepa, o do HSBC, a lista de sonegadores inclui mais de sete mil contas de brasileiros que mantinham valor superior a US$ 7 bi depositado junto a recursos de traficantes e terroristas internacionais na subsidiária suíça do banco britânico.

Sugestivamente, o valor equivale aos R$ 18 bilhões que o ministro ‘Joaquim Mãos de Tesoura’ pretende obter com economias extraídas da redução de direitos dos trabalhadores, alongando o prazo de acesso ao seguro desemprego etc.

Naturalmente, não se trata de um capricho contábil do ministro.

A equação fiscal condensa uma correlação de forças.

Aqueles que, a exemplo de Carta Maior, evocam espírito público da parte dos profissionais da medicina, diante da dimensão emergencial do ‘Mais Médicos’, não podem exigir menos da pátria rentista que assim se locupleta.

Sabe-se de antemão que seu quociente de solidariedade é baixo. Por certo, inferior a 0,38% dos cheques robustos que emite.

Essa era a alíquota da CPMF, derrubada no apagar das luzes de 2006, por um mutirão que reuniu la creme de la creme do espírito cidadão entre nós: a coalizão demotucana, os endinheirados, o jogral midiático conservador e alguns estranhos próceres da esquerda que se avoca consequente.

Não por acaso a foto comemorativa desse golpe contra as filas do SUS é muito, muito, incomodamente muito semelhante ao flagrante da alegria conservadora na comemoração da vitória recente de Eduardo Cunha à presidência da Câmara.

Não é só uma coincidência estética: a junção das imagens ilustra a interação entre a injustiça fiscal e hegemonia conservadora no país.

Essa espinha dorsal só se quebra nas ruas: será nelas, não nas mãos dos centuriões do mercado que a questão fiscal deixará de ser uma extensão do poder dos endinheirados, para se tornar uma ferramenta do desenvolvimento convergente da sociedade.

Discutir essa travessia é o objetivo deste novo Especial de Carta Maior. Não é propriamente um enrêdo de folia para esses dias de carnaval. Mas o fato é que por aí tem samba: o samba de um futuro em que as mandíbulas da injustiça social sejam apenas uma alegoria de escola de samba, sobre um Brasil que passou.

Boa leitura.

Créditos da foto: Tambako The Jaguar

Texto original: CARTA MAIOR

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

SwissLeaks o caramba! O nome do negócio é Suíçalão do HSBC

A mídia que achincalha a Petrobrás protege indecorosamente o HSBC e os barões ladrões por trás desse grande escândalo financeiro.


Antonio Lassance
Um escândalo de grandes proporções abala o mundo das finanças.

O assunto envolve ninguém menos que o segundo maior banco do mundo, o HSBC, e políticos, grupos de comunicação, esportistas, artistas e demais celebridades do mundo dos superendinheirados.

Os bacanas, milhares deles brasileiros, cometeram crimes de sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e evasão em grandes proporções. Isso sem contar com outros crimes que podem estar associados à origem do dinheiro.

Depósitos milionários foram feitos no banco britânico HSBC, em sua filial na Suíça, para desviar montanhas de dinheiro que deveriam ser pagas em impostos, mas que preferiram fazer um passeio pelos Alpes.

Não se trata de dinheiro privado. É dinheiro público depositado em contas privadas. É corrupção da grossa, mesmo que feita por 'gente fina' - gente diferenciada, pelo menos por suas contas bancárias; e gente educada, pelo menos na arte de sonegar impostos e lavar dinheiro. 


Sonegação e lavagem de dinheiro são e devem ser tratados como crimes de assalto aos cofres públicos. Por isso, a tradução exata do escândalo conhecido lá fora como SwissLeaks (**), em bom Português, é Suíçalão.

Suíçalão do HSBC, para ficar claro o mentor intelectual do crime e para manter no ar a suspeita, mais que plausível, de que muitos outros bancos possam ter feito o mesmo.

É preciso tratar o caso pelo apelido que ele merece, nem acima, nem abaixo do que se fez com os mensalões, o petrolão e o trensalão.

Chega de camaradagem com a corrupção privada. Sonegação e lavagem de dinheiro são coisas de gente que faz - como dizia a propaganda do finado Banco Bamerindus, doado a esse mesmo gigante das finanças, o HSBC, por um Banco Central que foi sempre muito benevolente com Londres e a Suíça.

O fato de que os crimes relatados vinham sendo cometidos há décadas deixa claro como o mundo dos ricos é mantido em uma zona de conforto por governos - incluíndo-se aí seus bancos centrais -, judiciário e imprensa, mesmo quando as táticas são mais que conhecidas.

O escândalo ainda mostra como os grandes bancos são as maiores lavanderias do planeta. O HSBC não apenas abriu suas portas e seus cofres para os depósitos em dinheiro. O banco orientou clientes a como realizar em segredo práticas sabidamente criminosas.

Para coibir a prática de forma mais eficaz seria preciso estabelecer uma regulação do sistema financeiro internacional que impusesse maior transparência e punições mais duras. Alguém imagina que, sem isso, coisas desse tipo jamais irão se repetir? Claro que não. Ficar à espera de vazamentos é pouco.

Os barões ladrões brasileiros estão na nona colocação entre os que mais surrupiaram dinheiro, com a ajuda do HSBC suíço.

O valor sonegado apenas por esse seleto grupo está estimado, por enquanto, em R$ 20 bilhões.

O valor é próximo aos R$ 18,7 bilhões não pagos em impostos pelo Itaú quando realizou a fusão com o Unibanco, em 2008.

O dinheiro dessas duas 'pequenas' sonegações é maior que o de qualquer outro escândalo de corrupção, mas nem todos se escandalizam em igual proporção.

A corrupção fiscal é hoje o principal inimigo do Estado brasileiro, de suas políticas sociais, como a saúde, há décadas subfinanciada, e até mesmo de suas políticas fiscal e monetária.

Daria para pagar um bom pedaço dos juros da dívida pública com o dinheiro dos ricos, ou melhor, o dinheiro dos pobres que os ricos preferem sonegar.  

Apesar de todas essas evidências, o escândalo de corrupção até agora tem merecido apenas notas de rodapé do cartel de mídia aqui presente.

Como na época da ditadura militar, sabemos detalhes do escândalo mais pela mídia internacional do que pelo cartel midiático que nos habita.

A mídia que achincalha a Petrobrás protege indecorosamente o HSBC e os barões ladrões por trás desse grande escândalo financeiro. Todos são tratados com candura ou mantidos em obsequioso segredo.

É que, para nossa mídia orwelliana, todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que outros.

(*) Antonio Lassance é cientista político.

(**) A expressão SwissLeaks se refere aos vazamentos ('leaks') que permitiram que investigações sob segredo de justiça se tornassem públicas. A Suíça ('Swiss') foi o destino preferido do dinheiro roubado.
Créditos da foto: reprodução (montagem: Carta Maior)
Texto original: CARTA MAIOR

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Mídia atropela a notícia para servir ao “governo anterior”

publicado em 13 de fevereiro de 2015 às 10:54

Foto do Facebook de Maurício Machado registra: “período que antecede o governo petista” é governo FHC!

por Luiz Carlos Azenha

Milhares de pessoas cercam o prédio de uma assembleia legislativa. Encaram bombas e balas de borracha. Impedem a votação do plano de austeridade de um dos principais governos estaduais do Brasil.

Manchete da Folha? Outra notícia, vinda também de Curitiba, extraída de um antigo depoimento do doleiro: José Dirceu sabia (dos desvios na Petrobras). Depoimento, aliás, desmentido pelo próprio. E pelo também citado tesoureiro do PT, João Vaccari. O doleiro disse à PF o que bem entendeu. No caso, ele é o réu confesso. Mas sua palavra é publicada como verdade absoluta e inquestionável.

O que está acontecendo?

O suposto envolvimento de Dirceu cai como uma luva no roteiro. Mensalão + petrolão = Lula derrotado em 2018. Mas, para que tenha credibilidade, é preciso eliminar do escândalo o que a Globonews chamou de “período que antecede o governo petista”. Sarney? Itamar? Médici?

É por isso que, como notou o presidente do PT, a curiosidade dos delegados que colhem depoimentos na Operação Lava Jato parece se fixar no período pós-2003.

É como se Youssef, o doleiro, não tivesse servido também a tucanos.

Aliás, a credibilidade do PT está no fim com os eleitores também pelo fato de o partido ter convivido muito bem, sempre, com a herança maldita dos antecessores.

A origem da máfia dos sanguessugas — que vendia ambulâncias superfaturadas — foi o ministério da Saúde sob José Serra, mas ela prosseguiu depois que Lula assumiu o poder.

O mesmo aconteceu com a máfia dos vampiros — que negociava hemoderivados.

O PT de Lula, em nome de um acordo em Minas, manteve no poder em Furnas o diretor Dimas Toledo, justamente o homem da Lista de Furnas, o esquema de financiamento de campanha de tucanos e aliados através dos fornecedores da estatal.

Marcos Valério serviu ao esquema de caixa 2 do PSDB e aliados antes de repetir a jogada com o PT e aliados.

Quando o PT no poder teve a oportunidade de provocar rupturas com o passado, não o fez.

CPI do Banestado? Terminou em acordão. CPI da Privataria? Nem então, nem depois do livro de Amaury Ribeiro Jr.

Quando um delegado da Polícia Federal teve a coragem de encanar o banqueiro, o governo se voltou… contra o delegado. O chefe da Polícia Federal foi mandado para o exílio. O banqueiro hoje financia um site de apoio ao governo Dilma!

Quando um repórter da Veja foi flagrado em aliança jornalística com o bicheiro, o PT olhou, olhou e fez que não viu.

Por isso, não foi surpresa quando o vice de um governador tucano — Afif Domingos — se tornou ministro de uma presidente petista.

Ninguém enrubesce com a perspectiva de ver Marta Suplicy, petista histórica, concorrendo à Prefeitura de São Paulo pelo PSB com o apoio de Geraldo Alckmin.

É nesta geleia geral que Curitiba assume relevância ainda maior. Não a Curitiba do Moro, mas a que impediu a austeridade de Beto Richa.

É junho de 2013, de novo.

Mas a mídia não entendeu isso. Ela está ocupada na campanha que parece não ter fim: criminalizar apenas um dos irmãos — eles estão ficando cada vez mais parecidos.

Não mencionem “PSDB” que ela enterra nas páginas internas. Na Globo, como famosamente saia no Jornal Nacional já na campanha de 2006, é “o governo anterior”.

Para esconder o grande desastre em andamento no Brasil, o apagão da água em São Paulo — este sim, não é um depoimento sem provas –, disfarça criando a perspectiva de um racionamento de energia que ainda nem é considerado.

É a mídia, em campanha permanente contra o trabalhismo desde 2003.

PS do Viomundo: Conforme dissemos anteriormente, quando a blogosfera entrou em surto com a eleição de Eduardo Cunha, ele nunca se interessou pelo impeachment de Dilma. Definido como lobista por Altamiro Borges, o deputado carioca é isso: serviçal da grana. Ele não vai entregar a chave do cofre para os tucanos. Jamais. Cunha é o artífice da reação da elite brasileira contra junho de 2003. Se deixarem, vai fazer uma reforma política que nos fará ficar com saudade daquele Congresso cercado pelos manifestantes.

Leia também:
PT pede que investigações da Lava Jato se estendam ao governo FHC

Texto original: VI O MUNDO

A pauta da rebelião curitibana

A mídia, abestalhada de tanto bolor reacionário, não deu a mínima para os protestos contra as medidas do governo do Paraná, que coincidentemente, é do PSDB

Da redação

Na última quinta-feira, Curitiba, a capital paranaense, assistiu a uma rebelião como há muito não se via no estado, governado atualmente pelo tucano Beto Richa, reeleito em 2014.

Milhares de professores e servidores públicos em greve cercaram a Assembleia Legislativa do Estado para impedir a entrada de deputados e a sessão do dia. Na pauta principal havia um fornido pacotaço de arrocho que atingiria duramente a qualidade da escola pública e a remuneração do professorado do Paraná.

A base de apoio de Beto Richa, festejada pela mídia conservadora como um ’tucano promissor’ após a reeleição em primeiro turno no ano passado, conseguiu alcançar o prédio viajando em ônibus blindado e escoltado, que usou o acesso dos fundos do edifício.

Foto: Leandro Taques / Mídia Ninja 

O episódio só elevou a tensão do lado de fora.

A partir daí, o aparato policial que despejava bombas, cacetes e gás nos manifestantes percebeu que a revolta dificilmente seria contido sem sangue quando a massa decidisse invadir o prédio.



Acuado pelo formigueiro humano em ebulição, o governador do PSDB recuou e retirou o pacotaço da pauta. De saída chamou de ‘baderneiros’ os manifestantes que festejavam nas ruas da capital paranaense sem baixar o cerco na Assembleia. 

Fosse na Ucrânia, ou no conflagrado Paquistão, ou ainda no Congo, ou por certo se ocorresse no entorno da Casa Rosada, na Argentina, melhor ainda, tivesse havido um cerco semelhante no palácio do governo em Caracas, quem sabe em Havana, como reagiria a mídia isenta e seu colunismo abestalhado de tanto bolor reacionário? 

Foto: Leandro Kissner / Fotos Públicas 

Abriria fotos de cinco colunas na primeira página dos diários e providenciaria escaladas extras dos telejornais em cobertura ao vivo.

Em estado de choque, porém, com o atropelamento de um de seus delfins, o que se viu de fato foi a suavização indecorosa do noticiário do levante curitibano, que teve suas imagens sonegadas em quase todos os diários na primeira página, e uma cobertura envergonhada nas internas. A Folha, por mérito, se impõe como paradigma dessa norma. Ao lado de uma foto de Pizzolato, entrando e um carro na Itália, deu um pequeno registro da explosão popular em Curitiba na 1ª página. E só na página 8 voltaria ao assunto com uma cobertura burocrática na qual não informava, sequer, o motivo da revolta e a reivindicação dos manifestantes: imedir o desmonte da escola pública por um governador do PSDB.

Para suprir essa lacuna deliberada de informação, leia abaixo as explicações do Sindicato dos professores do Paraná:

GREVE GERAL! BARRAR O DESMONTE DA ESCOLA PÚBLICA NO PARANÁ

Ele foi eleito Governador, não Imperador!

Só a mobilização imediata com uma GREVE GERAL por tempo indeterminado poderá barrar a sanha destrutiva do governo Beto Richa(PSDB) sobre a educação do Paraná!

Os(as) Trabalhadores(as) em Educação Pública do Paraná, através da APP-Sindicato, vem há décadas lutando intensamente pela ampliação de seus direitos, por melhores condições de trabalho e consequentemente por uma escola pública de mais qualidade. Juntamente com colegas educadores(as) de todo o Brasil reunidos na CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, travamos uma luta por um sistema público de educação e por valorização dos profissionais da Educação que remonta aos tempos do Brasil imperial.

Assim pensando, lutando e resistindo, avançamos coletivamente nos últimos anos em conquistas importantíssimas como: Planos de carreira de Professores(as) e Funcionários(as), equiparação salarial do magistério – não faz tempo os professores recebiam salários muito mais baixos que os demais servidores aos quais também é exigido nível superior para ingresso no mundo do trabalho público paranaense – 1/3 de hora atividade para professores(as) – tempo destinado ao trabalho docente fora da sala de aula - eleição para diretores(as) de escolas, além de manter uma luta permanente pelos direitos de uma aposentadoria digna depois de uma vida laboral dedicada aos fazeres do ensino-aprendizagem das gerações.

A reeleição em primeiro turno do governador do estado promoveu uma verdadeira guinada no comportamento de um político que afirmou com todas as letras que não mediria esforços para a valorização da escola pública e de seus Educadores. Em debate com os demais candidatos na APP-Sindicato no dia 19 de agosto, durante a campanha eleitoral, assumiu compromissos com uma pauta extensa que estava até agora em processos de debates, em grupos de trabalho, construção esta que vai por terra com as ultimas medidas adotadas.

Foram inúmero ataques até agora:

- Cancelamento do processo de eleição dos diretores e diretoras das escolas – o governador juntamente com um grupo de deputados estadual, desfez a própria resolução que havia desencadeado todo o processo. As escolas já tinham realizado assembleias, eleito comissões eleitorais e chapas já haviam se inscrito para o pleito marcado para o final de novembro/2014.

- Tarifaço final de ano – Além de penalizar toda a população paranaense com aumentos do IPVA, e a tarifa de ICMS de mais de 95 mil produtos, atacou a previdência pública, taxando em 11% o salário dos aposentados do estado bem como criou o fundo complementar para os futuros servidores públicos, estes fundos tem sido criticados mundialmente especialmente pela insegurança que geram quanto ao futuro pois quebra princípios caros na cultura previdenciária brasileira como o da solidariedade entre ativos e inativos.

- Impedimento de matrículas para 6º anos do Ensino Fundamental e 1º ano do Ensino Médio em muitas escolas de pequeno porte, especialmente as escolas do campo, em curto período em escolas estarão fechadas para sempre, novamente sem ouvir a comunidade escolar nem os diretores.

- Decretos da posse – Não bastasse os mais de 20 projetos de lei do pacotaço, em plena data da posse o governador anuncia um conjunto de decretos que promovem uma não assumida reforma de estado.

Outras dívidas com a Educação:

- 29 mil professores(as) PSS – contratados temporários – com atrasos de pagamento, sem acertos da rescisão, demitidos sumariamente.

- 10 mil funcionários(as) de escola afastados com a promessa de corte de 30 % deste efetivo – as escolas do Paraná carecem de mais funcionários(as) para atender adequadamente os(as) estudantes.

- Não pagamento (conforme o governo anunciara) de 1/3 das férias – cerca de R$ 150 milhões.

- Não pagamento de promoções e progressões de professores(as) e funcionários(as) durante todo o ano de 2014, direito esse garantido pelos Planos de Carreira dos dois segmentos. Essa dívida já soma 90 milhões.

- Atraso sistemático no repasse de parcelas do fundo rotativo – esse recurso são utilizados para a manutenção e pequenos reparos nas escolas.
- atrasos do pagamento de convênios com escolas, entidades da educação especial, escolas itinerantes da reforma agrária.

- cancelamento da distribuição de aulas feitas em dezembro.

- Retomada de portaria antiga sobre o porte de escola – portaria esta que reduz horas para direção das escolas, número de pedagogos e pedagogas, funcionários(as) em número insuficiente para manter as escolas em condições de atender adequadamente os(as) estudantes.

- Superlotação de alunos(as) em salas de aulas.

Não bastasse todo o DESMONTE que denunciávamos como o caos instalado na educação do Paraná, veio mais um pacote de maldades divulgado nesta quarta-feira pela ALEP – Assembleia Legislativa do Paraná!

As mensagens de lei 01/2015 e 02/2015, enviadas pelo governador Beto Richa, se aprovadas pelos deputados(as), promoverão um tão retrocesso nas escolas que não serão recuperados senão em longo prazo. Gerações serão penalizadas com a precarização da escola pública.

Essas mensagens promovem um ataque com retirada de direitos de todos os segmentos dos Trabalhadores(as) em Educação, inclusive os(as) aposentados(as).

GASTOS DO ESTADO – Temos avaliado que a crise financeira do Paraná, passa principalmente pela péssima gestão desta área no governo Richa. Retrocessos na transparência tornam cada vez mais difícil estabelecer uma avaliação adequada e mais precisa. Porém ações governamentais apontam a opção clara deste governo neoliberal, promover estado mínimo com enriquecimento da parcela encastelada no poder: mais de R$ 400 milhões, em publicidade e propaganda, aumento de mais de 4.000% em processamento de dados, rompendo a política de software livre; aumento de 295% para salários dos cargos comissionados; antecipação de receitas extraordinárias que farão faltas futuramente; renegociou precatórios.

Assim sendo, com o agravamento da crise generalizada no interior das escolas paranaenses, iremos para a assembleia estadual no sábado(07), em Guarapuava, num consenso preliminar de que não há mais um dia sem iniciar a greve geral.

O esforço e a pauta central da greve será exatamente lutar para derrotar este pacotaço de desmonte geral dos direitos dos(as) TRABALHADORES(AS) EM EDUCAÇÃO bem como barrar o DESMONTE ORGANIZATIVO E ADMINISTRATIVO DAS ESCOLAS.

Hermes Silva Leão, professor de Educação Física e Pedagogo, é Presidente da APP-Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná

Créditos da foto: Leandro Taques / Mídia Ninja

Texto original: CARTA MAIOR

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Grupo Abril desaba. 'Veja' sobreviverá?

A Abril Educação, que era considerada a fonte de sustentação das revistas do grupo, acaba de ser vendida. E agora, Veja? Pra onde correr?

Altamiro Borges - altamiroborges.blogspot.com.br

No início de janeiro, os funcionários do Grupo Abril, que edita a asquerosa revista “Veja”, foram surpreendidos na chegada ao prédio da empresa, na capital paulista. O busto do fundador do império midiático, Victor Civita, havia sido retirado do hall de entrada. Em grave crise financeira, a empresa foi obrigada a devolver metade do espaço à Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, que é dona do edifício. Agora, eles recebem outra notícia preocupante. A Abril Educação, que era considerada a fonte de sustentação das revistas do grupo, acaba de ser vendida para o fundo de investimentos Tarpon. O clima nas redações é de suspense e temor. Antes desta negociação, a empresa já havia fechado vários títulos e transferido outros, num processo agonizante que já se estende há três anos. Agora, ninguém sabe qual será o futuro das publicações que restaram do Grupo Abril.

Segundo relato da Folha, a empresa da famiglia Civita “vendeu a totalidade das ações da Abril Educação para fundos de investimentos da gestora Tarpon, em uma operação avaliada em R$ 1,3 bilhão. O valor representa a soma da fatia de 20,73% do capital social total adquirido nesta segunda-feira (9) com os 19,91% que o Tarpon havia adquirido em agosto do ano passado, considerando o valor de R$ 12,33 por ação. De janeiro a setembro de 2014, a Abril Educação faturou R$ 753,7 milhões, alta de 32,6% ante igual período do ano anterior. A venda do negócio de educação é mais um passo no processo de enxugamento que vem sendo implementado no Grupo Abril desde a morte do empresário Roberto Civita, em maio de 2013. Desde então, a empresa descontinuou quatro títulos (‘Alfa’, ‘Bravo’, ‘Gloss’ e ‘Lola’), vendeu as frequências da MTV e transferiu dez títulos para a Editora Caras”.

Quando da queda do busto de Victor Civita, o jornalista Paulo Nogueira, do blog “Diário do Centro do Mundo”, escreveu um artigo demolidor sobre “A agonia da Editora Abril” e do restante da mídia tradicional. Agora, com a notícia da venda da totalidade das ações da Abril Educação, as suas palavras se revelam ainda mais verdadeiras. Reproduzo o texto baixo:

*****

A retirada do busto de Victor Civita do saguão da sede da editora Abril neste começo de janeiro é um capítulo dramático do declínio acelerado daquela que foi uma das maiores empresas de jornalismo.

A Abril está morrendo.

Victor Civita foi abatido porque a Abril já não tinha mais como bancar o aluguel do megalomaníaco prédio da Marginal de Pinheiros.

Ao devolver uma das duas torres, perdeu o direito de exibir o fundador da empresa. Para os futuros inquilinos, o busto de VC, como era chamado, não faria sentido nenhum.

A morte de uma empresa de jornalismo é um processo lento. Não é fácil identificar o momento em que as coisas começam a dar errado.

Depois tudo se aclara, e o fim é evidente. As últimas etapas são agônicas, e é isto o que a Abril está vivendo.

A torre remanescente dificilmente sobreviverá por muito tempo, bem como uma série de revistas e, lamentavelmente, centenas de empregos.

Como todas as empresas que gozam de reserva de mercado e são objeto de mamatas do Estado – anúncios copiosos, financiamentos a juros maternais em bancos públicos – a Abril nunca foi exatamente um modelo de administração.

É o preço que se paga por privilégios. Você não tem que ser o melhor da classe para receber prêmios.

Isto vale para a Abril e todas as grandes empresas jornalísticas brasileiras, a começar pela Globo.

Nunca foram expostas à competição estrangeira e sempre foram mimadas por sucessivos governos: não há receita mais eficaz para a ineficiência gerencial.

Dito isso, a agonia da Abril se deve muito mais a uma mudança de mercado do que a uma gestão trôpega em vários momentos.

Produzir revistas nestes tempos é como fabricar carruagens no final do século 19, quando os carros começavam a ganhar as ruas.

Nem o mais fabuloso fabricante de carruagens sobreviveu com o correr dos dias.

A Abril antecipa o que deve acontecer, no futuro, com outra potência da mídia brasileira: a Globo.

Anos atrás, ninguém imaginava um mundo sem revistas. Mas hoje é fácil imaginar.

Até há pouco também, igualmente, ninguém imaginava um mundo sem tevê como a conhecemos. Mas hoje já não é tão difícil imaginar.

Uma pesquisa recente americana traduziu isso em números. A pergunta que foi feita era a seguinte: você acha que seria duro viver sem o quê?

As alternativas eram internet, celular e televisão. A televisão ficou em último lugar. Alguns anos atrás, na mesma pesquisa, ficara em primeiro: a maior parte dos entrevistados não considerava a hipótese de ficar sem tevê.

Tanto a Abril como a Globo se empenham em ter relevância na internet. Mas jamais se replicará, no universo digital, a relevância que elas tiveram em mídias que vão se tornando obsoletas.

Aproxima-se velozmente do fim o tempo em que a Globo consegue cobrar uma fortuna por comerciais de uma programação em constante declínio.

E está muito distante a era em que a publicidade na internet terá preços remotamente praticados pela Globo na tevê.

Entre uma coisa e outra, a Globo entrará no que se poderia definir como “Vale do Desespero”, para usar uma expressão em voga entre os economistas.

Na destruição de um velho mundo na imprensa e na construção de um novo, a remoção do busto de Victor Civita é um marco histórico.


Créditos da foto: Ayolt de Roos / Flickr (montagem - Carta Maior)

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Petrobras: Maior prêmio da indústria de petróleo e gás offshore mundial

Pelas tecnologias desenvolvidas para produção no pré-sal, Petrobras receberá em Houston (EUA) o prêmio que é considerado o 'Oscar' das empresas de petróleo

Petrobras: Blog Fatos e Dados

Em maio de 2015, em Houston (EUA), a Petrobras receberá pela terceira vez o prêmio OTC Distinguished AchievementAward for Companies, Organizations, and Institutions em reconhecimento ao conjunto de tecnologias desenvolvidas para a produção da camada Pré-Sal. Esse prêmio é o maior reconhecimento que uma empresa de petróleo pode receber na qualidade de operadora offshore.

Em 1992, a Petrobras recebeu o prêmio por conquistas técnicas notáveis relacionadas ao desenvolvimento de sistemas de produção em águas profundas relativas ao campo de Marlim e, em 2001, por avanços nas tecnologias e na economicidade de projetos de águas profundas, no desenvolvimento do campo de Roncador.

Em carta comunicando a premiação à Petrobras, o Presidente da Offshore Technology Conference (OTC), Edward G. Stokes, destacou: “Este prêmio é um reconhecimento das conquistas notáveis, significativas e únicas alcançadas pela Petrobras, e das grandes contribuições para a nossa indústria (óleo e gás offshore). O comitê de seleção (da OTC) ficou extremamente impressionado com esta nomeação. As conquistas que a Petrobras fez na perfuração e produção desses reservatórios desafiadores são de classe mundial. A indústria aprendeu muito a partir das informações compartilhadas pela Petrobras sobre o Pré-Sal nos artigos e sessões apresentados na OTC. Nós todos nos beneficiamos do seu sucesso.”

Desde 1969, a OTC promove anualmente o maior evento de negócios do mundo na área de produção offshore de óleo e gás. É frequentado por praticamente todas as operadoras de óleo e gás offshore, além de seus fornecedores. Atualmente tem uma frequência de 100 mil congressistas de 130 países.

Nele é discutido o estado da arte da tecnologia offshore de exploração, perfuração, produção e proteção ao meio ambiente e também são exibidas as mais recentes inovações em produtos e serviços da atividade de exploração e produção.

Produção no Pré-Sal

O recente recorde de produção de óleo na camada Pré-Sal, de 713 mil barris diários de petróleo, obtido em 21/12/2014, demonstra a robustez das tecnologias aplicadas.


Texto original: CARTA MAIOR

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Ives Gandra na trincheira da oposição golpista

Esqueçamos as sutilezas: o PSDB, derrotado nas urnas, está buscando a manifestação de juristas para derrubar o governo eleito democraticamente.

Wadih Damous, ex-presidente da OAB-RJ, é advogado

A Folha de São Paulo publicou nesta semana artigo de Ives Gandra Martins, consistente na síntese de um parecer que ele próprio teria elaborado acerca da existência de fundamento jurídico para o impeachment de Dilma Rousseff.

Segundo ele, ao contrário do que alguns veículos de mídia já haviam noticiado, o parecer não foi contratado por nenhum empreiteira, mas sim por um advogado a ele próximo, Dr. José de Oliveira Costa, que vem a ser – coincidência? - advogado de Fernando Henrique Cardoso e membro do Conselho do Instituto FHC.

Segundo o resumo publicado, o parecer teria analisado diversos textos legais para chegar à conclusão de que a hipótese de impeachment por culpa (e não por dolo) seria juridicamente possível e que há concretamente culpa configurada por parte de Dilma relativamente aos alegados desvios e supostos atos de má gestão na Petrobrás.

Ives Gandra afirma não saber quem é o verdadeiro contratante, enquanto o advogado contratante diz que a contratação do parecer não tem conotação política.

Como não acredito em “coincidências” na política, vamos deixar de lado as filigranas: pareceres jurídicos são contratados por centenas de milhares de reais para fundamentarem alguma investida jurídica, não para mero deleite ou sede de aprendizado de seu contratante. 

Também não é razoável, para dizer o mínimo, que um advogado contrate um parecer para si próprio (ainda que o faça em seu nome), e sim para algum cliente seu que pretenda se amparar em seus fundamentos e conclusões para adotar determinada medida juridicamente relevante, seja preventiva, seja contenciosa.

Outra “ingenuidade” é achar que alguém contratado para elaborar parecer jurídico tem liberdade para analisar a questão a ele apresentada, de forma neutra. A não ser em caso em que o parecer tem finalidade puramente preventiva (o que obviamente não é o caso, já que trata de fatos já consumados), ninguém pagará centenas de milhares de reais sem saber as conclusões que serão apresentadas. Na prática, a liberdade de convicção do parecerista se limita à recusa em elaborar o parecer, por ter convicção jurídica que contraria os interesses do contratante.

Ainda por cima, tal artigo foi publicado poucos dias após Fernando Henrique Cardoso (ao que tudo indica, verdadeiro contratante do parecer) ter publicado artigo em que defende abertamente a virada de mesa por meio de alguma investida jurídica. Também não pode ser coincidência o fato de terem apelado, logo de início, para um jurista notoriamente conservador e entusiasta do golpe civil-militar de 1964, do Ato Institucional-5 e da repressão praticada naquele triste período da história brasileira.

Então, esqueçamos as sutilezas: o PSDB, derrotado nas urnas, está buscando a manifestação de juristas para derrubar o governo eleito democraticamente. Não é à toa que, ao final do artigo, Ives Gandra afirme já contar com o apoio informal de outros dois juristas de renome.
Bem, quanto ao mérito, o artigo revela pouco sobre o conteúdo substancial do parecer. 

Mas, pelo tal resumo, Dilma teria cometido crime de responsabilidade ao não impedir, enquanto Presidente do Conselho de Administração da Petrobrás, que ocorressem desvios de dinheiro e que a empresa fosse prejudicada pela compra da refinaria de Pasadena, e, enquanto Presidenta, de “manter a mesma diretoria que levou à destruição da Petrobrás”.

Além de amparar tais conclusões em fatos cuja existência e dinâmica ainda não foram apuradas satisfatoriamente pelos órgãos competentes, bem como lançar a polêmica tese de que os crimes de responsabilidade podem ser omissivos, o que Ives Gandra está propondo, em suma, é que o Administrador Público deve responder criminalmente pelos atos de seus subordinados.

Trata-se do mesmo Ives Gandra que, em passado recente, ao emitir opinião pessoal livre (e não por ocasião de um parecer encomendado), manifestou-se veementemente contra a teoria do domínio do fato, a qual, como é sabido, amparou parte das condenações na Ação Penal 470, conhecida como “mensalão”. Repare-se que, nessa ocasião, não estava em jogo a destituição de um governo, mas apenas a condenação criminal de alguns cidadãos. Confira-se uma de suas manifestações sobre o tema:

– Com ela (teoria do domínio do fato), eu passo a trabalhar com indícios e presunções. Eu não busco a verdade material. Você tem pessoas que trabalham com você. Uma delas comete um crime e o atribui a você. E você não sabe de nada. Não há nenhuma prova senão o depoimento dela – e basta um só depoimento. Como você é a chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está condenada, você deveria saber. Todos os executivos brasileiros correm agora esse risco. É uma insegurança jurídica monumental. Como um velho advogado, com 56 anos de advocacia, isso me preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no Supremo foi a doin dubio pro reo.

Ora, a vingar o raciocínio do Ives Gandra de 2015, chegar-se-ia à absurda consequência de se sujeitar o Presidente da República ao impeachment caso qualquer servidor público federal, em qualquer instância, pratique ato de improbidade e saia ileso, seja por não ter processo disciplinar instaurado, seja por ter sido indevidamente absolvido.

O raciocínio está errado, em primeiro lugar, porque o parecerista adota parâmetros da lei de improbidade para configuração de ato penalmente relevante. A analogia não é possível, já que a principiologia do direito penal é substancialmente diversa e tem como princípios fundamentais, dentre outros, a presunção de inocência e o in dubio pro reo. Por força dessa principiologia não há que se falar, no caso de crimes de responsabilidade, de modalidade culposa, a qual só poderia ser admitida por disposição expressa de lei.

Outro erro de premissa na tese de Ives Gandra é a de tentar atribuir crime de responsabilidade à Presidenta por ato praticado em outro cargo (Presidente do Conselho de Administração da Petrobrás). Ora, o crime de responsabilidade é crime próprio do Presidente da República, Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Procurador-Geral da República, por atos praticados no exercício dessas funções. Com relação ao Presidente da República, isso está mais do que claro no Art. 4º da Lei 1.079/50: só configuram crime de responsabilidade atos praticados no exercício do respectivo cargo.

Já a tese de que a Presidenta poderia ser responsabilizada pelo simples fato de não ter trocado a direção da empresa, cabe lembrar que a Petrobrás não é um órgão da Administração Direta, e sim uma sociedade de economia mista de capital aberto, da qual a maior parte das ações com direito a voto são titularizadas pelo governo federal. 

A Presidência, tecnicamente, não nomeia ou destitui seus diretores por ato meramente discricionário, tal como se daria no caso de um cargo de confiança, ou mesmo no caso da nomeação ou destituição de Ministros de Estado. 

Pode-se até dizer que, na prática, acaba ocupando o posto a pessoa indicada pela Presidência da República. Porém, tecnicamente, quem o elege é o Conselho de Administração, que pode alçar ao posto pessoa diferente daquela indicada pelo governo ou mantê-la a despeito da vontade do chefe do Poder Executivo.

Ainda que não fosse assim, a nomeação ou destituição de diretor nada tem a ver com sua responsabilização, que pode se dar apesar ou independentemente de sua permanência no cargo.

Reitere-se, ainda, que a tese está amparada em fatos cuja ocorrência sequer está ainda comprovada.

Por fim, cabe observar que o próprio Ives Gandra reconhece a inutilidade de sua equivocada tese jurídica, ao afirmar, com razão, que o processo de impeachment tem natureza política. Não custa lembrar, também, que as autoridades que podem sofrer impeachment não estão sujeitas à ação de improbidade administrativa, por conta da vedação do bis in idem – punir alguém duas vezes pelo mesmo fato.

Fica, então, essa reflexão ao leitor: qual Ives Gandra está correto? O que, enquanto “advogado militante há 56 anos“, preocupou-se com a grave ameaça ao Estado Democrático de Direito e ao Devido Processo Legal, rechaçando a responsabilização em cadeia dos chefes sobre os atos de seus subordinados no chamado mensalão, ou o Ives Gandra parecerista, chamado à trincheira da oposição, por meio da emissão de parecer contratado por aqueles que pretendem dar aparência legal para disfarçar um golpe de estado?

A vontade das urnas tem que prevalecer!
Créditos da foto: Assembleia Legislativa de São Paulo
Texto original: CARTA MAIOR

domingo, 8 de fevereiro de 2015

"Prende primeiro, pergunta depois"

Mais de 40% dos encarcerados brasileiros são presos provisórios que têm as vidas destruídas mesmo quando inocentes, antes de qualquer processo legal.

Andrea Dip, da Agência Pública

Francisco* (foto) estava no sofá assistindo televisão e aproveitando seu primeiro dia de férias, quando a polícia quebrou o portão e invadiu sua casa gritando, com armas em punho. Apesar de não saber do que se tratava, o coletor de lixo não reagiu nem para dizer que era trabalhador de carteira assinada. Por experiência anterior (ele já havia passado seis meses em um Centro de Detenção Provisória e depois inocentado) sabia que seria pior tentar argumentar naquele momento. A filha de 15 anos estava no banho, a esposa e a filha mais nova, de 5 anos, não estavam na casa, localizada no litoral sul de São Paulo. 

Foi levado algemado para a delegacia do DHPP, na capital. Só então ficou sabendo que a vítima de um sequestro, um homem que pagara 400 mil reais de resgate, havia supostamente reconhecido sua tatuagem em um álbum de pessoas com passagem pelo sistema carcerário, apresentado pela polícia. A vítima teria dito que o sequestrador tinha uma tatuagem no braço, e escolhido Francisco no álbum com fotos de ex-detentos que batiam com a descrição de tipo físico e da tatuagem mostrado pela polícia. 

Mesmo com provas e testemunhas de que estava trabalhando nos dias em que a vítima afirmou ter ficado 24 horas sob olhares do algoz, em outra cidade, Francisco ficou preso por dois meses no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros, em São Paulo, em uma cela “pequenininha assim”, com mais de cinquenta pessoas, “às vezes mais, às vezes menos”, esperando que o delegado chamasse a vítima para um novo reconhecimento.

“O delegado dizia que não estava encontrando o homem” conta a esposa de Francisco, que acabou ela mesma descobrindo o endereço e passando ao delegado. “Só aí que ele ficou sem graça e chamou pra reconhecer” lembra a mulher. Durante os dois meses em que esteve no CDP, Francisco não viu as filhas, porque não queria que as meninas passassem pela humilhação da revista vexatória. O que mais o marcou foram as revistas com cães dentro das celas, quando eram obrigados a se despir e se encolher “com os cães fungando no cangote”.

Quando saiu, perdeu o emprego. “Me disseram que foi porque a empresa foi vendida e tiveram que demitir algumas pessoas” explica. Diz que a filha pequena chora quando vê passar um carro de polícia na rua – tem medo que levem o pai mais uma vez. Sua esposa tem trabalhado dobrado pra sustentar a casa enquanto ele procura outro serviço. Mas com seu nome ainda não liberado do processo, “tá bem difícil”.

O caso de Francisco dá feição humana aos números escandalosos do encarceramento provisório no Brasil, denunciados por vários órgãos de defesa de direitos humanos e, mais recentemente, pelo Relatório Mundial 2015, da Human Rights Watch, publicado em janeiro, que analisa anualmente avanços e retrocessos na proteção dos direitos humanos em mais de 90 países. 

Sobre o Brasil destaca esse gargalo do sistema penitenciário entre denúncias de tortura, tratamento cruel, desumano ou degradante e falta de infraestrutura dos presídios. Em setembro de 2014, o Grupo de Trabalho da ONU sobre Prisão Arbitrária também apresentou um relatório apontando a superlotação endêmica, o acesso à justiça severamente deficiente e o encarceramento como regra e não exceção mesmo em casos de delitos leves e sem violência.

O “Mapa das Prisões” da organização de direitos humanos Conectas, mostra um crescimento de 317,9% na taxa de encarceramento (número de presos por cada grupo de 100 mil habitantes) do país entre 1992 e 2013, passando de 74 para 300,96 enquanto a Rússia, por exemplo, registrou redução de cerca de 4% no mesmo período.

Segundo os últimos dados disponibilizados pelo InfoPen do Ministério da Justiça de junho de 2013, o Brasil contava com mais de 581 mil pessoas privadas de liberdade, 41% delas em prisão provisória. É a quarta maior população carcerária do mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China e Rússia. O déficit de vagas supera 230 mil.

No estado do Amazonas mais de 70% dos encarcerados são presos provisórios e em São Paulo 36% do total, segundo os últimos dados do Ministério da Justiça. Mas de acordo com Bruno Shimizu, defensor público do Núcleo de Situação Carcerária de São Paulo, o número de provisórios é ainda maior já que esta conta diz respeito apenas aos presos sem julgamento, não incluindo os que não tiveram ainda o processo concluído: “Os dados apontados pelo Depen não mostram um número real porque quando a pessoa tem uma sentença de 1o grau ela continua sendo inocente até o fim do processo”.

Uma pesquisa feita em parceria entre Depen (Departamento Penitenciário Nacional) e IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) apontou que, em 37,2% dos casos em que há aplicação de prisão provisória, os réus não são condenados à prisão ao final do processo ou recebem penas menores que seu período de encarceramento inicial.

Pela ordem pública
“O Brasil é conhecido internacionalmente como um país que extrapola qualquer limite no número de prisões preventivas. É uma prisão que pela Constituição é excepcionalíssima e na prática ela é a regra. No fim das contas, serve como uma forma antecipada de pena e como forma de contenção social mesmo” diz o defensor público coordenador do Núcleo de Situação Carcerária Patrick Cacicedo. 

Ele explica que a prisão preventiva ou cautelar, segundo a lei, serve para garantir o andamento regular do processo. “Pela lei e pela nossa Constituição, que diz que ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’, ela só deve ser utilizada quando se tiver elementos concretos que mostrem que aquela pessoa vai atrapalhar o andamento do processo de alguma maneira, fugir, em casos de crimes contra a ordem econômica do país ou para a garantia da ordem pública. E é aí que se prende mais. Porque ninguém sabe o que é ‘ordem pública’. É um termo vago. Quando não se tem um motivo concreto – e quase nunca tem – ela faz valer a grande maioria das prisões preventivas” explica. 

Muitas vezes, como mostra a pesquisa Tecer Justiça – Presas e presos provisórios da cidade de São Paulo, feita pelo Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e Pastoral Carcerária, o primeiro contato entre o defensor e o acusado coincide com a realização da audiência de instrução, debates e julgamento, que pode vir a acontecer meses após a prisão.

10 anos no limbo
O processo de Gabriel* (foto), ao qual a Pública teve acesso, chega a ser inacreditável. 

O homem, réu confesso de homicídio em 2004 teve o processo suspenso pouco tempo após sua prisão preventiva decretada a partir de um flagrante. O motivo foi um laudo psiquiátrico que considerou-o inimputável. O juiz determinou que ele fosse internado em um hospital-presídio para tratamento imediato. Por repetidas alegações de falta de vagas, permaneceu em Centros de Detenção Provisória por 10 anos. Durante esse período, foi avaliado periodicamente por especialistas que reafirmavam sua condição mental e a necessidade de tratamento urgente. Só em 2014, o caso foi parar no Supremo Tribunal Federal e Gabriel foi finalmente transferido para um hospital-presídio. 

E ele é exceção não por conta do longo tempo que passou esquecido – isso é mais ou menos comum – mas porque a parcela de presos provisórios por homicídios é ínfima perto de crimes como furto, roubo e tráfico de poucas quantidades de drogas, segundo a pesquisa do IITC. 

Enquanto as vítimas são majoritariamente brancas (mais de 70%) os réus são em sua maioria pretos e pardos (67%), têm entre 18 e 25 anos, um ou dois filhos, com expressiva incidência de situação de rua. Mais de 80% das mulheres presas são mães. O relatório aponta ainda que na unidade do CDPI de Pinheiros, muitos são usuários de drogas ou dependentes químicos e vivem em situação de rua.

"Quem a viatura para?” questiona o desembargador Marcelo Semer, membro e ex-presidente da Associação Juízes para a Democracia, que atua na área criminal há 25 anos e passou alguns deles em uma Vara Criminal de São Paulo. “90% dos processos que a gente tinha na Vara Criminal eram de flagrantes da Polícia Militar, era quem fazia nossa triagem. E a PM aborda muito mais na periferia que no centro, muito mais o jovem que o idoso, o negro que o branco, isso já traz uma seleção”, define. “E o réu é o último a ser ouvido, isso não acontece antes de dois meses”. 

Rafael Custódio, coordenador do programa de justiça da Conectas acrescenta: “Só depois desse período acontece o primeiro contato do réu com juiz e o defensor público. Se há tortura, como está o contato com a família, condições de saúde, tudo isso só vai ser avaliado depois desse tempo. Quer dizer, o Estado só sabe que esse cara existe depois de no mínimo dois meses”.

Segundo levantamento de 2013 da Anadep (Associação Nacional de Defensores Públicos) e do Ipea, o Brasil conta hoje com 11,8 mil juízes, 9,9 mil promotores e apenas 5 mil defensores. Só no Fórum da Barra Funda, em São Paulo, cada defensor é responsável por 2,5 mil processos criminais. 

Lei veio pra soltar, mas prende ainda mais
Em 2011, foi criada a lei 12.403/2011 para tentar melhorar esse cenário. Ela proibiu, por exemplo, a prisão preventiva nos casos em que mesmo se a pessoa fosse condenada não receberia pena de prisão. Também trouxe mais opções de medidas cautelares que podem substituir a prisão. Mas o que se tem visto, segundo os defensores públicos, é que a lei tem prendido mais do que soltado. 

“Uma das medidas que ganhou força com essa lei foi a fiança. Então para uma pessoa que não pode ter a prisão preventiva decretada, o juiz determina que pague tantos salários mínimos. E aí a gente descobriu uma coisa assustadora que é o número de pessoas presas simplesmente por não ter dinheiro para pagar essa fiança” explica Patrick. “No início tiveram casos absurdos de fiança de 5 mil reais para moradores de rua. O juiz diz ‘não estou decretando prisão, estou pedindo fiança’ e a pessoa não tem como pagar”. 

Bruno lembra um caso recente: “Nós acabamos de soltar uma mulher que tinha furtado uma barrinha de chocolate e o juiz sentenciou a pagar fiança de um salário mínimo. Obviamente ela não tinha o dinheiro, por isso ficou presa. E o juiz sabe disso, né? Ele não é inocente nessa história, a finalidade é essa, de continuar um projeto higienista de tirar a pobreza da rua e já que não dá pra jogar todo mundo na prisão a gente dá um jeito de fazer isso! A gente tinha várias reformas para diminuir a população carcerária no país que incrivelmente só incrementam”. 

Patrick lembra de um caso tocante: "Eu estava no Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária de São Paulo), na Barra Funda e tinha dois casos de fiança. Chegaram duas famílias. Uma tinha juntado todo o dinheiro que podia e foi para o Fórum com 600 reais. A outra tinha um pouco mais. Mas as duas eram muito pobres. A decisão do juiz, para as duas famílias, foi fiança de um salário mínimo. Uma das famílias tinha e a outra não. O juiz não quis reduzir o valor. Então uma família deu a diferença para a outra. ‘Olha, meu filho foi liberado, não achamos justo o seu ficar. Toma aqui esses 180 reais’". 

Marcelo Semer acrescenta: “Com a nova lei aumentou o número de crimes afiançáveis e portanto o uso da fiança. Só que, para quem não tem condição de pagar fiança, significa prender. E eu vi isso muitas vezes na Vara Criminal. Em muitos casos o réu já podia ter pago a fiança mas não pagou e estava preso. A gente tem que somar isso a uma enorme seletividade da prisão. Acho que esse é o problema maior. A gente só tem esse volume grande de prisão provisória porque ela é seletiva. Só tem esses milhares de presos provisórios porque atinge uma camada excluída”. 

Outro ponto polêmico, segundo Semer, é o uso de tornozeleiras eletrônicas. “A ideia da tornozeleira seria interessante se tirasse as pessoas da prisão mas o que se faz, em via de regra, é levar um pouco de prisão para a liberdade. Naqueles casos em que a pessoa vai ser solta, o juiz manda por a tornozeleira para a pessoa não ficar totalmente solta”.


A advogada Gabriela Ferraz, do ITTC explica: “Tem dois momentos em que você poderia usar a tornozeleira: a primeira é quando o juiz tem algum elemento de que a pessoa vá fugir ou que ameaça alguma testemunha, algum elemento concreto. E serviria para que a pessoa não fosse presa e reduzir o contingente carcerário. Em segundo lugar, nas saídas temporárias. No natal, por exemplo”. 

Bruno Shimizu acrescenta: “Não é uma tornozeleira, é uma tornozeleira com uma mochila e um GPS bem difícil de carregar. A mochila não pode ficar distante da tornozeleira. Qual é o resultado disso? Quando a defesa pede que se aplique uma medida cautelar para que a pessoa não fique presa, o juiz responde não temos tornozeleiras então vamos decretar prisão. Mas quando a pessoa já teria direito a saída de natal, tem tornozeleira”. 

Patrick lembra que a Defensoria foi convidada a participar de uma Audiência Pública na Assembléia Legislativa, para discutir o uso de tornozeleiras e percebeu que o perfil da plateia estava diferente do usual. “A plateia estava cheia de pessoas engravatadas. Na hora em que abriram para as perguntas, todas as pessoas que levantaram as mãos eram representantes de empresas desse equipamento, querendo participar de licitação”. Semer observa que “o Estado natural do réu dentro do processo é a prisão quando na lógica tem que ser ao contrário. Quando você libera o réu diz que concede liberdade provisória. Só por esse nome a gente já vê o quão fugaz é a ideia de liberdade”.

O que o Estado me devolveu
Dona Rosa chega à sede da entidade “Mães dos Cárceres”, fundada e mantida pela rapper Andréia M.F na Praia Grande, com vários papéis dobrados nas mãos. São os laudos médicos e receitas que mostram os surtos que seu neto tem desde que saiu do CDP da Praia Grande há mais de 5 anos. 

A avó conta que ele foi pego, aos 18 anos, em uma batida policial em um salão onde cortava os cabelos e levado junto de pequenos traficantes. Ficou lá por dois anos. “Quando ele saiu, não era o mesmo. Eu percebi que ele foi mudando comigo, sabe? Quando eu ia visitar ele não me reconhecia, me mandava embora. E eu que criei ele, a gente era muito apegado”. 

Quando ele saiu, conta Dona Rosa, não reconhecia ninguém, não quis voltar a trabalhar e nas poucas vezes que abriu a boca foi pra dizer que comeu sabão, que sofreu, que quase morreu e para brigar com ela. “Ele nunca teve nada, daí agora o médico disse que é esquizofrenia. Ele quebrou minha casa inteira, me expulsou de casa. Eu vendo camarão na praia e ele não me deixa entrar lá pra cozinhar. Estou dormindo em um quartinho do lado da casa mas não sei como vou fazer. Internaram ele na Santa Casa mas mandaram de volta um mês depois. Ele não quer tomar o remédio, não quer fazer o tratamento, já apanhou na rua de uns meninos e da polícia. Você vê, foi isso que o Estado me entregou de volta”.

Lei de drogas agrava o problema
Rafael Custódio acredita que a lei de drogas também agrava muito o uso abusivo da prisão provisória no país. “Não dá pra falar sobre presos provisórios sem falar sobre lei de drogas. Porque 90% dos presos relacionados a drogas são presos em flagrante, muitos de uma vez. 60%, 70% tem um perfil muito claro que é o cara da periferia, jovem, que é preso sem armas, já distante da sociedade de consumo estabelecida e que é preso por conta dessa estrutura a criminal que a gente tem. Quem mais age aí é PM, que é quem mais prende no Brasil. E ela trabalha na lógica da quantidade mesmo, que é uma lógica pouco inteligente e sofisticada, quase sem investigação. Você não está desarticulando o sistema do tráfico de drogas, sequer chegando perto disso. Você pega o menino que está nessa atividade que é rapidamente substituído. Nosso sistema hoje é construído para proteger o patrimônio e cumprir lei de drogas”.

Marcelo Semer acrescenta que a lei mais severa também criou um grande problema de encarceramento feminino. “Antes o número era pequeno mas elas passaram a a cumprir no mínimo três anos em regime fechado. Nem homicídio cumpre isso”.

Tortura e más condições
Na pesquisa do ITTC, abundantes foram os depoimentos de homens e mulheres que disseram ter vivenciado experiências de tortura como o “zigue-zague” (para desorientar e fazer com que as pessoas algemadas batam a cabeça), o “micro-ondas” (quando o suspeito fica horas “esquentando” dentro do camburão) , o uso de spray de pimenta diretamente nos olhos e no nariz, a invasão de domicilio, o flagrante forjado, a extorsão, a discriminação racial e a ameaça contra parentes (inclusive crianças). 

“Em se tratando da população feminina, também foram marcantes as denúncias de violência sexual, que abrangem pedido de propina sexual, apalpadas durante a revista por policial masculino, obrigação de ficar nua e ameaça de estupro” aponta. Os números chamam a atenção: dos entrevistados, 57% dos homens disseram ter sido abordados por policiais muitas vezes; 56% disseram ter sido agredidos verbalmente por policiais muitas vezes, 35,6% disseram ter sido agredidos fisicamente por policiais muitas vezes. Entre as mulheres o número cai para 19,4% abordadas muitas vezes por policiais; 23% agredidas verbalmente; 10,2% agredidas fisicamente muitas vezes e 43,7% que viram muitas vezes policiais agredirem pessoas.

As más condições dos Centros de Detenção Provisória também têm sido denunciadas pelos órgãos de direitos humanos. “O CDP de Pinheiros chegou a abrigar mais de 1700 presos ao passo que sua capacidade é de 520, tendo sido interditado em dezembro de 2010, período que foram interrompidas as inclusões. A penitenciária feminina de Santana possui capacidade para 2400 mulheres mas sua população, em 2010, era de 2700 (ver site da SAP) das quais 840 eram presas provisórias” relata a pesquisa do ITTC. No CDP da Praia Grande, a situação é tão grave – há mais de 1600 presos em um espaço com capacidade para 512 em instalações e condições extremamente precárias – que a Defensoria Pública entrou com uma Ação Civil Pública pedindo sua interdição parcial.

“O CDP de Pinheiros já tem essa alcunha de novo Carandiru, porque tem 6 mil homens onde cabem 4 mil. E você conversa com os caras lá, são viciados em crack então roubaram, ou são viciados por isso traficam. Tem uma das unidades que fica a população de rua, a cracolândia, casos que não representam nenhum perigo” comenta Rafael Custódio. E acrescenta: “Os CDP’s geralmente são piores do que as penitenciárias porque em geral a estrutura física não é praquilo, não foi concebida para ter tanta gente, por tanto tempo. São grandes pra encher de gente. Falta médico, dentista, advogado, atendimento psicológico, roupa, comida de qualidade”.

O Centro de Detenção Provisória do Complexo de Pedrinhas, no Maranhão, também ganhou a mídia em 2014, quando mais de 15 homens foram encontrados mortos e mais de 100 fugiram.

Audiência de custódia
Ainda neste mês de fevereiro deve ser implementado em São Paulo um projeto piloto, de Audiência de Custódia. A ideia é que, dentro de 24 horas, o juiz entreviste o preso e ouça manifestações do seu advogado ou da Defensoria Pública, além do Ministério Público. Ele deve analisar se a prisão é necessária e poderá conceder a liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares. Também poderá avaliar se houve tortura ou maus-tratos. 

Na verdade, isso não é algo novo. 

A audiência de Custódia está prevista em pactos e tratados internacionais assinados pelo Brasil como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San Jose. Caso não seja distorcido como a lei de 2011, deve começar uma mudança nesse cenário das prisões provisórias. Mas na opinião de quem trabalha com isso, é difícil de acreditar que uma política possa mudar um conceito maior, que está sob o guarda-chuva do encarceramento em massa.

“Qual é o centro do direito penal? A propriedade. Não é a vida. Quer ver? Para homicídio você tem uma pena que vai de 6 a 11 anos. Excepcionalmente quando qualificado você tem uma pena que vai pra 12 anos a 30. O roubo com arma já começa com no mínimo 5 anos e 4 meses. E há uma chance muito maior do homicídio simples ganhar o semi-aberto do que o roubo. Você pega o sequestro que a gente tem como um crime grave. O sequestro em si é um crime leve. Quando você coloca sequestro com objetivos libidinosos ele fica um pouco mais duro. Mas ele se torna um crime grave quando é extorsão mediante sequestro. Quando tem dinheiro é um crime ‘top’. O latrocínio já começa com 20 anos. Mesmo que não tenha sido intencional. Se na hora do roubo a vítima morre, mínimo de 20 anos. Se furtar uma coisa pequena sua ou se ele te der um soco e você ficar internado no hospital é a mesma coisa. Todo o direito penal, o epicentro dele é a propriedade privada. Então se o crime contra a propriedade é mais importante, é obvio que o pobre vai ser mais preso do que o rico” explica Semer.

E a coordenadora de pesquisa do Programa Justiça sem Muros do ITTC, Raquel da Cruz Lima, conclui: “A gente está chegando em um ponto insustentável. Mesmo o gestor mais entusiasta das prisões está em dificuldade. Faltam mais de 200 mil vagas e já se provou que com esse modelo não é possível. Essas alternativas que têm surgido também estão ligadas a essa insustentabilidade. Mas se o sistema continuar respondendo de forma dura, cruel, com a finalidade desse encarceramento compulsório, nada disso vai adiantar”.
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*Os nomes foram trocados para preservar a identidade dos entrevistados

Assista ao minidoc do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania sobre Como se Prende no Brasil.


Créditos da foto: Joseh Silva/Agência Pública

Texto original: CARTA MAIOR